Quando aqueles que deveriam ensinar sobre valores são os primeiros a se comportar de forma vergonhosa e degradante, algo está profundamente errado.
Falo dos pais que vão assistir aos filhos jogando futebol e, de maneira desprezível, ofendem as crianças do time adversário. Então eu pergunto: como esses pais poderão ensinar valores e respeito ao outro? Onde atitudes como essas irão nos levar?
A cultura da intolerância que migrou para o campo infantil

Antes, víamos brigas em estádios, violência entre torcedores — cada um “defendendo” seu time às custas de agressões.
Uma cultura de intolerância e impunidade que, infelizmente, agora se repete em outro cenário: os jogos infantis. São crianças em busca de realizar o sonho de se tornarem grandes jogadores, mas o ambiente onde deveriam encontrar incentivo vem sendo tomado por hostilidade e violência.
Pior: muitas vezes essa violência vem dos próprios pais, que cobram e ofendem no lugar de apoiar.
Palavras que ferem
As ofensas são cruéis: chamam as crianças de “negro”, “viado”, “perna de pau”, e até incentivam a “quebrar a perna do outro”. Palavras que, além de machucar, destroem o espírito esportivo e a formação emocional de quem as ouve.

Um bom exemplo existe

Nesta semana, meu filho participou de um campeonato de futebol na escolinha onde treina. Alguns pais estavam presentes e, graças a Deus, não houve — e espero que não haja — esse tipo de comportamento.
Pelo contrário: vi pais torcendo pelas outras crianças, elogiando os bons passes e comemorando juntos.
Infelizmente, tem sido uma realidade isolada. O que se vê pelo país é o oposto. Em Feira de Santana, por exemplo, os pais invadiram o campo para agredir jogadores – e até o treinador do próprio filho, quando ele foi substituído.
E engana-se quem pensa que essas atitudes são exclusivas dos homens. As mães também têm protagonizado cenas lamentáveis.
Vi crianças chorando após perder uma partida e pais elogiando o esforço, valorizando a participação.
Isso é empatia — um gesto nobre e necessário num mundo cada vez mais carente de humanidade.
Sim, é difícil ver um filho errar, perder ou se machucar.
Mas reações agressivas não ajudam em nada.
Crianças ainda não sabem se autorregular emocionalmente, e é papel dos pais serem o porto seguro, o exemplo de equilíbrio e escuta.
Se o adulto perde o controle, que tipo de comportamento ele está ensinando?
O time do meu filho não foi classificado, e vi meu filho sofrer — mas acolhi e validei todo o seu empenho. O campeonato ainda não terminou, mas até agora ele é o artilheiro.
O papel dos pais na formação emocional
Essas crianças estão em formação, dedicadas não apenas a um esporte, mas a um projeto de vida. Enfrentam limitações, aprendem sobre superação e sonham em alcançar o sucesso, inspiradas por nomes como Messi, Neymar ou Cristiano Ronaldo. O papel dos pais é apoiar, incentivar e ensinar valores — de forma respeitosa e honesta.
Eles são parte fundamental da estruturação da personalidade dos filhos, processo que envolve fatores genéticos, emocionais e sociais, além de experiências afetivas e do tipo de vínculo estabelecido com os pais.
Um ambiente familiar que ofereça apoio, segurança, afeto e limites é essencial para um desenvolvimento saudável.

As feridas invisíveis
Palavras destrutivas afetam diretamente o psicológico das crianças.
Mesmo aquelas que vivem em lares equilibrados podem se abalar e duvidar de si mesmas após episódios de humilhação pública.
E não é só a derrota que causa desequilíbrio — até a vitória pode gerar hostilidade.
Nem todos aceitam perder, e o espírito competitivo tem ultrapassando os limites do respeito.
No fim, parece que o importante é ganhar — custe o que custar —, ainda que o outro sofra.
Presença ou pressão?
Os pais devem acompanhar seus filhos nos treinos e campeonatos — isso fortalece o vínculo e a autoestima da criança.
Mas essa presença só é benéfica se for afetiva, respeitosa e encorajadora.
Dependendo do tipo de relação construída, a presença do pai ou da mãe pode gerar alegria, mas também constrangimento ou medo. O futebol vai muito além da competição: é formação física, emocional e social.
Ajuda no desenvolvimento motor, na autoestima e na autoconfiança, além de uma vida mais saudável.
Infelizmente, muitos pais estão mais preocupados com o placar, a medalha e o troféu do que com o aprendizado e a experiência.

O que realmente ensina
Comportamentos agressivos nada ensinam de bom.
O que educa é a presença respeitosa, o apoio constante e a valorização do esforço, independentemente do resultado.
A derrota pode ser tão educativa quanto a vitória — basta saber olhar. A participação dos pais pode ser um impulso positivo ou um verdadeiro pesadelo.
E, quando o limite se perde, as maiores vítimas são as crianças.
Um alerta necessário
O que leva esses pais a se comportarem assim?
Seria a incapacidade de lidar com a frustração?
A vergonha da derrota?
Ou talvez a projeção de sonhos não realizados?
A Federação Paulista de Futebol lançou a campanha “Ódio mais Futebol”, com o vídeo “Pais de Castigo”, https://www.youtube.com/watch?v=qXYFF-6o_9Uque retrata bem essa problemática.
Mas será que apenas proibir a presença dos pais resolve?
Talvez não, pois certas atitudes ultrapassam a falta de civilidade e beiram o crime.

O jornal The Guardian (Londres) escreveu uma matéria sobre esse mesmo assunto: um pai ameaçou esfaquear o árbitro — um retrato extremo, mas não isolado.
Muitos desses adultos são pais frustrados, que projetam nos filhos sonhos que não realizaram, buscando compensar o próprio fracasso — ou até garantir uma futura “aposentadoria” com o sucesso do filho.
São muitas as camadas desse problema, mas uma certeza permanece:
nada justifica o desrespeito, a humilhação e a violência.
Até a próxima! Um grande beijo e fiquem com Deus😉.
Fonte: A Influência dos pais no envolvimento da criança com o esporte durante a iniciação esportiva no futebol em uma escolinha de Campo Bom - RS (Dione Hélio de Almeida, Rafael Machado de Souza).
